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Foto do escritorSalmom Lucas Monteiro Costa

Empresa realiza estudo sobre a contaminação de alimentos na Bacia do Rio Doce

ATI - Cáritas Diocesana de Governador Valadares faz uma análise dos relatórios. Veja quais são os alimentos e as conclusão que foram feitas pelo perito oficial


Nas últimas semanas, tem repercutido entre as pessoas atingidas, Assessorias Técnicas Independentes, Instituições de Justiça e imprensa os resultados de dois relatórios técnicos (Relatórios nº 58 e 59) que tratam da questão da qualidade do alimento de origem vegetal e animal que utilizam a água dos rios atingidos pelo rejeito derramado em decorrência do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 2015. 


O estudo foi elaborado pela empresa Aecom do Brasil, perito oficial nomeado pelo Juízo Federal, no curso da Ação Civil Pública nº 1000412-91.2020.4.01.3800 e em atendimento ao Eixo Prioritário nº 06 (Medição da Performance e Acompanhamento). A Assessoria Técnica Independente - Cáritas Diocesana de Governador Valadares (ATI CDGV) fez uma análise do material e traz as principais informações que a população atingida precisa saber. Em linhas gerais, o processo refere-se à questão da segurança alimentar dos produtos agropecuários irrigados com as águas dos rios Doce, do Carmo e Gualaxo do Norte, todos atingidos pelo rompimento.


A segurança de um determinado alimento, de acordo com o relatório, é avaliada em função da concentração de cada substância química verificada no alimento e do tempo de exposição da ingestão daquele alimento. 

Mas, o que isso quer dizer na prática? Significa, por exemplo, que uma coisa é comer, pontualmente, uma banana com elevado grau de substâncias tóxicas, outra coisa é comer, todos os dias e por um longo período de tempo, bananas contaminadas. Ou seja, como dito, a segurança alimentar será avaliada em função da concentração de cada substância química e do tempo que o indivíduo estará exposto ao alimento, além da própria condição física da pessoa que ingere o alimento e de como será absorvido pelo organismo. Quer dizer, existem variáveis que devem ser levadas em consideração para avaliar a questão da segurança alimentar.  


Segundo o relatório, ao citar o seu referencial teórico, “se o consumo de um alimento for considerado preocupante, isto não significa necessariamente que danos à saúde serão observados, mas sim que medidas de gerenciamento devem ser tomadas. Isto porque os valores de segurança baseados em saúde não são valores limites para o início da toxicidade em qualquer população exposta observada. No entanto, quanto mais frequentemente esses níveis são excedidos e quanto maior a excedência, maior a probabilidade de ocorrência de alguma manifestação tóxica”. 


Dessa forma, um dos métodos adotados para o estudo, consistiu na coleta de amostras dos produtos agropecuários das propriedades que se encontram dentro da área de interesse da pesquisa, para que fossem analisadas. Foi utilizado como base a comparação entre os resultados das concentrações encontradas nos alimentos com os padrões legais estabelecidos por instruções normativas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e do Ministério de Agricultura e Pesca. No caso de um alimento não possuir limites máximos definidos no Brasil, foram utilizados os limites estabelecidos por organizações internacionalmente reconhecidas, como Codex Alimentarius (conjunto de padrões alimentares adotado internacionalmente) e os regulamentos da União Europeia.


Procedimentos de coleta e amostragem de vegetais, com a coleta de frutas (A), embalo e identificação (B) e armazenamento em baú refrigerado para transporte para a base de apoio (C). (Fotos: Aecom/Relatório nº 59)


Procedimentos de coleta e amostragem de leite, com a coleta de leite (A), embalo e identificação (B) e armazenamento em caixa térmica para transporte para a base de apoio (C). (Fotos: Aecom/Relatório nº 59)


E quais foram os resultados? 


Os relatórios apontaram que as verduras e o mel foram considerados seguros para o consumo humano. Entretanto, o estudo encontrou em alguns produtos substâncias que indicam preocupação à saúde, que foram: 


  • Frutas: na banana (magnésio e manganês) e laranja (chumbo); 

  • Raízes e tubérculos: batata-doce (cromo VI) e mandioca (chumbo); 

  • Grãos: feijão (bário, boro, chumbo, cobre, magnésio, manganês, níquel, potássio, titânio e zinco); 

  • Leite: leite de vaca (arsênio III + V, chumbo, cromo VI, magnésio, metilmercúrio, potássio e titânio) e leite de cabra (chumbo, magnésio, titânio); 

  • Ovo: ovo de galinha (chumbo);

  • Carnes: carne de galinha (cromo VI e PCBs); 

  • Vísceras: fígado de galinha (chumbo) e fígado de boi (cobre).


Uma vez detectado o excesso de alguma substância nos alimentos, o estudo avaliou a relação (nexo de causalidade) do excesso encontrado com o rompimento da barragem de Fundão. Para isso, foram definidas áreas para o trabalho de campo chamadas de “área de interesse”, que UTILIZA a água do Rio Doce para a agropecuária e a “área de controle”, que está na bacia do rio, mas NÃO UTILIZA a água do Rio Doce . 


Assim, as amostras dos produtos agropecuários foram realizadas nos estabelecimentos pertencentes às áreas de interesse (24 municípios) e áreas controle (11 municípios). As áreas de interesse estão a uma distância de 1km das margens direita e esquerda. Já as áreas de controle foram definidas em locais com características geoquímicas parecidas da área de interesse, conforme pode ser observado na ilustração abaixo. 


Municípios da área de interesse: Aimorés, Itueta, Alpercata, Linhares, Baixo Guandu, Mariana, Barra Longa, Marilândia, Belo Oriente, Naque, Bom Jesus do Galho, Periquito, Bugre, Ponte Nova, Colatina, Resplendor, Conselheiro Pena, Santa Cruz do Escalvado, Galiléia, São José do Goiabal, Governador Valadares, Sem-Peixe, Ipaba e Tumiritinga. Municípios da área controle: Água Boa, Jampruca, Araponga, Pedra Bonita, Caputira, São Domingos do Norte, Conceição de Ipanema, São Sebastião do Anta, Governador Lindenberg, Santa Margarida, Inhapim MG


Para aplicar o nexo de causalidade foi realizada uma comparação das médias dos produtos da área de interesse com da área controle. Nesse sentido, quando as médias da área de interesse foram maiores do que a área controle, foram aplicadas análises estatísticas para comprovar ou não o nexo.


Nesse sentido, o nexo de causalidade foi detectado para os seguintes alimentos:


  • Frutas: Das 55 substâncias químicas analisadas, sete apresentaram preocupação para o consumo (bário, chumbo, cianeto, magnésio, manganês, metilmercúrio e potássio). Com a exceção do cianeto e do metilmercúrio, para todas as demais foi detectado o nexo de causalidade. A banana apresentou maior incidência.

  • Grãos: Apresentou preocupação para 11 substâncias químicas (bário, boro, chumbo, cianeto, cobre, magnésio, manganês, níquel, potássio, titânio e zinco). Com exceção do chumbo e do cianeto, para todas as demais substâncias foi detectado o nexo de causalidade.

  • Leite: Apresentou preocupação para 08 substâncias químicas (arsênio III+V, chumbo, cromo VI, magnésio, metilmercúrio, potássio, titânio e zinco). Foi detectado o nexo de causalidade no titânio.

  • Vísceras: Apresentou preocupação para 02 substâncias químicas (chumbo e cobre). Foi detectado o nexo de causalidade no cobre do fígado de galinha.


Já os alimentos em que apresentaram preocupação com as substâncias químicas que foram encontradas, mas não foi comprovado o nexo de causalidade, foram: 


  • Ovos: Apresentou preocupação para uma substância química (chumbo), mas não foi comprovado o nexo de causalidade.

  • Carnes: Apresentou preocupação para três substâncias químicas (cromo VI, PCBs e titânio), mas não foi comprovado o nexo de causalidade.

  • Legumes: Apresentou preocupação para uma substância química (chumbo), mas não foi comprovado o nexo de causalidade.

  • Raízes e tubérculos: Apresentou preocupação para duas substâncias químicas (chumbo e cromo VI), mas não foi comprovado o nexo de causalidade.


Muito importante


Todas as substâncias químicas encontradas acima, com ou sem nexo de causalidade, extrapolam os valores limites do tolerável de acordo com as normativas usadas como referência, mas isso não significa que danos à saúde serão observados, entretanto são importantes indícios para:


  • Adoção de medidas de gerenciamento de riscos;

  • Eventuais ações de vigilância em saúde;

  • Estratégias de controle de riscos identificados;

  • Além de estudos específicos, como, por exemplo, a avaliação toxicológica à saúde humana (monitoramento biológico).


Ou seja, como já explicado ao longo do texto, quanto mais frequente esses níveis são excedidos e quanto maior a excedência, maior a probabilidade de ocorrência de alguma manifestação tóxica.


Como o estudo foi feito? 


Como forma de organizar o estudo, a Aecom, primeiramente, caracterizou o uso e ocupação do solo nas margens do Rio Doce, por meio de um levantamento aerofotográfico. Com as fotografias aéreas, o perito identificou as áreas de plantios, apontando quais culturas são cultivadas na região, bem como os animais que são criados. Foram dois trechos analisados.


Fotografias aéreas de exemplos de possíveis pontos de captação de água nos rios afetados pelo rompimento, nos municípios de Mariana (A), Alpercata (B), Galiléia (C) e Amorés (D). (Fotos: Aecom/Relatório nº 58)


O Trecho 1 inicia na barragem de Fundão (Mariana/MG) e termina no limite municipal de Rio Doce/MG, localizado a aproximadamente 12 km após a UHE Risoleta Neves (Rio Doce/MG). 


O Trecho 2 inicia no limite municipal de Rio Doce/MG, logo após a UHE Risoleta Neves e termina na foz do rio Doce (Linhares/ES). O Território 4 (Governador Valadares e Alpercata) está inserido no Trecho 2.



 Como forma de delimitação do objeto de pesquisa, foi considerada uma distância de 500 metros (Trecho 1) e 1000 metros (Trecho 2), tanto na margem esquerda como na margem direita, a qual denominou-se “área de interesse”.


Após essa caracterização, foi necessário aplicar um questionário aos estabelecimentos agropecuários da área de interesse, para cruzar com as informações obtidas pelo levantamento aéreo, bem como para confirmar quais deles utilizavam/utilizam a água dos rios atingidos pelo rompimento em seus estabelecimentos. Foi levantado pouco mais de 100 vegetais, que são irrigados pelas águas dos rios. Esses vegetais foram organizados em: frutas, verduras, legumes, raízes e tubérculos. Já na produção pecuária, foram encontradas as seguintes criações (produtos e derivados): bovino de corte e leite, caprinos e ovinos, suínos, galos e galinhas, codornas, patos, gansos e animais aquáticos.


Juntamente a esse levantamento, também foi aplicado um Questionário Quantitativo de Frequência Alimentar (QQFA) à população, com objetivo de estimar a média de consumo dos alimentos na região. A população foi organizada por faixa etária e por sexo. As faixas definidas foram de: 1 a 6 anos; 7 a 18 anos; e acima de 18 anos. Assim, a segurança da qualidade do alimento foi aplicado a essas faixas etárias.


E por último, como mencionado acima, foram coletadas as amostras dos produtos agropecuários para que fossem analisadas.


O papel das Assessorias Técnicas Independentes


Com a Assessoria Técnica Independente - Cáritas Diocesana de Governador Valadares (ATI CDGV) em campo a partir de fevereiro de 2023, as pessoas atingidas do Território 4 (Governador Valadares e Alpercata) passaram a dispor de suporte técnico na busca pela garantia da reparação integral pelos danos causados em decorrência do rompimento da barragem de Fundão. 


Em menos de um ano de atuação, a ATI - CDGV tem apoiado as comissões locais na elaboração de ofício solicitando providência sobre os temas relativos à reparação integral dos danos, incluindo os de tema meio ambiente e saúde.


Caso deseje maiores informações sobre os relatórios publicados, as pessoas atingidas de Governador Valadares e Alpercata podem procurar o escritório da ATI localizado na rua Vereador Euzebinho Cabral, número 315, centro de Governador Valadares e dialogar com a equipe que estará à disposição. 


Para conferir os relatórios na íntegra, é só clicar: Relatório Nº 58 e Relatório Nº 59.


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